educação

PLURAL: os textos de Neila Baldi e Juliana Petermann

A que custo?
Neila Baldi 
Professora universitária

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Era uma segunda-feira como outra. Comecei a reunião do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid) perguntando como estavam, como tinha sido a semana. Eis que a primeira pessoa que responde, desabafa: exausta. E com ela, as demais começam a fazer queixas do momento. Ficamos boa parte da reunião numa espécie de terapia em grupo, falando de como nos sentíamos e, sim, isso também é formação docente. Nossa professoralidade não é só construída com saberes pedagógicos e da área de conhecimento com a qual trabalhamos.

Aquele momento foi mais que desabafo: foi uma reflexão sobre o ensino remoto, o produtivismo nas universidades, o excesso de trabalho, etc. Naquele dia, lembrei de uma frase do Klauss Vianna: A criatividade exige espaço. Estava eu, diante de estudantes de Dança, ouvindo-os sobre a dificuldade em ter ideias para produzir trabalhos criativos. Como criar diante do excesso de tarefas?

EXAUSTÃO

A licenciatura exige um número de horas que faz com que o curso, em determinados semestres, seja integral. Ou seja, no presencial já era puxado. Tanto que a média nacional de índice de conclusão, no caso da Dança, é de 35%. Isso não significa que apenas 35% se formem, mas que demoram mais do que quatro anos para concluir o curso.

Agora, coloca isso no remoto, numa pandemia. Se fosse apenas EAD, talvez a carga não fosse tão grande - mas, estarmos há dois anos com nossas vidas limitadas, interfere na nossa saúde mental. Ficar horas em frente a um computador é exaustivo. Ficar horas assistindo aulas e produzindo tarefas, mais ainda.

PAUSA

O desabafo de minhas alunas e alunos fez eu pensar também em algo tão caro pelo que temos lutado, neste período pandêmico: por férias. Como o primeiro semestre letivo de 2020 não ocorreu no tempo certo - em algumas instituições foi adiado para o segundo e, no caso da UFSM, foi estendido - foi preciso recuperar este "tempo perdido". Outro dia, vi a postagem da UJC, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mostrando que o intervalo entre os semestres caiu para até 16 dias. O mesmo ocorreu em várias outras instituições. Os semestres foram mais curtos, com intervalos menores. Em um ritmo acelerado.

A menina que começou o desabafo, naquela reunião, falou em crise de ansiedade. E disse-me: "prof, tem dias que me sinto medíocre, não dou conta de ser criativa o tempo todo". Com lágrimas nos olhos, lhe respondi: "Eu também. Estamos todos no mesmo barco. Tem dias que me sinto a pior professora do mundo, coloco toda a criatividade em uma disciplina e me falta pras outras. Estamos exaustas".

Que a gente compreenda isso quando voltarmos para o presencial.

Contorcionismo

Juliana Petermann
Professora universitária

Este é o primeiro artigo endereçado à temática da educação, aqui, no novo formato da coluna Plural. Começo, então, destacando duas datas especiais: o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, celebrado no último dia 11, e o aniversário de dois anos do meu filho. Duas datas que, aparentemente, não possuem nenhuma relação, mas, é só olhar com atenção, e lá estarei eu me esticando toda, mas ainda sem conseguir acomodar, nas míseras 24 horas do dia, as tarefas do ensino (que envolve também pesquisa e extensão) e do cuidado materno. Não há flexibilidade que resolva. Enquanto meu filho sopra a velinha dos dois aninhos, eu completo dois anos da experiência da docência e da ciência com a maternidade. No meu caso, com o plus de ter tido essa vivência no contexto pandêmico e do home office. Situação que, se por um lado me permitiu viver cada primeira experiência do meu bebê, também me exigiu um conjunto de novas habilidades.

MALABARISTA

Enquanto faço o nenê dormir, corrijo um trabalho de conclusão de curso, lembro do prazo para o envio do artigo para a revista, preparo minha fala para uma palestra. É tanta bolinha jogada para o alto que, mais do que malabarista, eu deveria ser um polvo. Ontem, meu filho não quis tirar a soneca da manhã. Em princípio, nenhum problema, nos próximos dias, ajustaremos a rotina. Mas não é exatamente assim: a hora da soneca é o momento precioso em que o deixo no berço e, como num passe de mágica, desapareço do quarto. Qualquer ruído poderia colocar tudo a perder. Ressurjo na lavanderia. Enquanto as roupas lavam, já vou respondendo e-mails, preparo a aula do dia seguinte, faço o parecer de um artigo. Não tem truque que resolva: faço uma pausa para estender as roupas.

EQUILIBRISTA

Os dados mostram que andamos na corda bamba. A produção científica cai significativamente nos dois primeiros anos de vida do bebê. Além disso, segundo o Parent in Science, mais da metade das cientistas mulheres no Brasil são as únicas ou principais cuidadoras dos filhos. Antes da pandemia, 45% delas afirmavam não conseguir trabalhar em casa. Com o home office, o problema se agravou: apenas 47% das cientistas mulheres com filhos estavam conseguindo submeter artigos, contra 76% dos cientistas homens sem filhos. Comparando com os cientistas com filhos, 52% seguiu publicando, enquanto somente 28% das mães, com filhos de até seis anos, conseguiram submeter seus artigos. Não há espetáculo - nem de flexibilidade, nem de equilíbrio e nem de ilusão - que dê conta de tamanha desigualdade. Shhh! O bebê dormiu e eu consegui terminar este artigo.

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